segunda-feira, 16 de dezembro de 2013

Entrevista com Luiza Helena Trajano....Presidente do Magazine LUIZA...



O POVO – A senhora entrou no varejo ainda menina. Como foi esse começo?
Luiza Helena Trajano – Nós começamos em Franca (SP). A empresa foi fundada pelos meus tios, em 1957. E eu, desde muito pequena, ficava na loja, olhando. Quando eu tinha 11 anos minha mãe falou: “enquanto você está presente, vai vender e vai ganhar uma comissão”. Eu fiz isso por todo o mês de dezembro e me saí muito bem. A partir daí, voltei em todas as férias. Eu ia lá para vender e ganhar comissão para dar presentes. Com 18 anos eu entrei em definitivo. Passei por todos os setores. Sempre procurando investir em cada setor. Eu gostava muito. 

OP – A senhora até hoje se define como vendedora...
Luiza – É, eu adoro vender (risos). E assim: na vida, todo mundo vende alguma coisa. 

OP – O que é um bom vendedor?
Luiza - É aquele que sabe entender as necessidades do cliente. É fazer a venda certa para a pessoa certa.

OP – É um desafio gerir uma rede tão grande? São mais de 700 lojas próprias...
Luiza - Nada é mais do que eu posso fazer. As coisas vão acontecendo. Eu faço o necessário, depois o possível. Realmente é um desafio, mas não é nada impossível. Você precisa ter uma equipe alinhada, comprometida. A toda hora você tem problemas diferentes do que quando era menor. Mas o importante é você saber lidar com o estresse e ter a cabeça de solução e não de problemas. Minha cabeça é muito mais voltada para dar solução do que uma cabeça de problemas. Eu treinei isso.

OP – A sua família está na empresa. Como é a relação entre profissionais e familiares?
Luiza - Nem toda a família. A empresa é bem profissional, entrou na bolsa. Mas não quer dizer que eu sou contra empresa de família. Nosso CEO (chief executive officer) não é da família. É muito importante uma empresa de família ser profissional. As pessoas não assumem cargos porque são filhos ou sobrinhos. Eu não assumi por causa disso. Eu assumi porque era competente para ser uma superintendente do varejo. Nosso CEO é um profissional como 90% dos nossos diretores. Mas a família pode trabalhar, desde que seja profissional também. 

OP – A senhora tem três filhos. Um deles está dentro da rede. Existe algum tipo de conflito entre ele e o CEO por exemplo?
Luiza - Não, não. Pelo contrário. Ele já trabalhou fora, tem competência, não só ele como meu sobrinho que também trabalha na empresa. Os dois são da família e obedecem ao CEO. 

OP – Voltando a essa experiência de vendas. Como o Magazine Luiza enfrenta a concorrência das redes regionais, que têm mais proximidade e identidade local?
Luiza - Nós temos muito respeito pelas redes locais e empresas pequenas. Quando você tem respeito, você aprende com eles. A gente procura pensar globalmente e agir localmente. Então, nosso gerente tem verba para trabalhar o social, a Rede do Bem (programa de responsabilidade social da empresa), as emissoras de rádio da cidade. Cada loja para nós, cada cidade é uma coisa importante. Não é só uma a mais. 

OP – As aquisições colaboram com esse “agir localmente”? No Nordeste, por exemplo, vocês compraram as Lojas Maia.
Luiza - Nós já fizemos 13 aquisições. E a gente procura pensar, até nas propagandas, tudo localmente. A gente tem um rito de cantar, toda segunda-feira, o hino nacional. E no Rio Grande do Sul, por exemplo, a gente canta o hino do Rio Grande (do Sul). Para eles, é muito importante.

OP – Existe uma crítica sobre o crescimento da economia brasileira, baseada em crédito e consumo interno. A senhora é uma defensora desse modelo.
Luiza - Eu queria até deixar isso bem claro. Existe uma crítica de pessoas que não estão entendendo bem. No Brasil, só 54% das pessoas têm máquina de lavar automática. No Nordeste, só 25%. Você precisa construir 23 milhões de (unidades do) Minha Casa, Minha Vida para ter o nível de igualdade social adequado aos Países em desenvolvimento. Como é que, em um País, as pessoas não têm o direito de ter casa própria, ter sua televisão, ter os móveis dentro? Então o Brasil tem um consumo ainda muito grande. Na economia, o pessoal não está endividado. E nem o Governo deu tanto incentivo para o consumo. Ele tirou uma máquina de lavar com IPI que era de 20% que era feito só para item e jogou para 10%. E na época, máquina só era vendida para rico. 

OP – A senhora foi cotada para ministra da Micro e Pequena Empresa. A senhora aceitaria o cargo?
Luiza - Olha, eu realmente fui cotada para ir. Mas eu não podia ir e não fui. Mas continuo trabalhando pelas micro e pequenas empresas fora do Governo. Porque estou na operação e isso ajuda você conhecer as dificuldades. Eu tenho muito contato com o pequeno empreendedor. 

OP – Como é essa ajuda, Dona Luiza?
Luiza - Ajuda mesmo de ver os projetos, de lutar para não termos mortes súbitas de empresas. Inclusive com o diálogo com as autoridades, por meio do IDV, que é o Instituto de Desenvolvimento do Varejo. 

OP – Qual é a sua relação com a presidente Dilma?
Luiza - Uma relação de admiração. Ela é muito séria e muito trabalhadora. Sempre que eu posso, estou ela. Sempre que sou convocada, estou com ela. Mas não é uma relação de todo dia. 

OP – A senhora também faz parte do conselho do (Fernando) Haddad na Prefeitura de São Paulo...
Luiza - Faço do Conselho do Governo Federal, também do Conselho das Olimpíadas 2016. Na prefeitura (de São Paulo), eu comecei agora e ainda não fui a nenhuma reunião. Eu sempre fui uma brasileira apaixonada pelo Brasil. Não pelo partido, mas para ajudar o Brasil. 

OP – A senhora nunca pensou em se filiar a algum partido?
Luiza - Não. Porque eu sou muito do Brasil como um todo, então eu tenho tentado ajudar cada dia mais. 

OP – Nem disputar um cargo eletivo?
Luiza - Não, não. 

OP – O Magazine Luiza foi uma espécie de precursor das lojas virtuais. Os produtos eram apresentados em fitas cassetes.
Luiza - Em 1991, a gente fundou uma loja virtual nas cidades pequenas que não tinham produtos de bolso. Quando o e-commerce chegou, a Magazine Luiza já estava fazendo multimídia. Já tinha mais de 18 mil imagens gravadas. Essa loja é um case em Harvard (universidade norte-americana). Na época era TV e vídeo, logo em seguida a gente mudou para multimídia. E que é multimídia até hoje. Depois da internet a gente simplesmente adaptou as imagens. 

OP – Ninguém chamou a senhora de doida na época, vendendo por fita cassete?
Luiza - (Risos) Muita gente falava. A gente colocava: Magazine Luiza traz para sua cidade a loja do ano 2000. 

OP - A senhora levou muitos funcionários de Franca para São Paulo. Isso é de praxe na abertura de novas unidades?
Luiza - A gente fez uma mudança para um escritório estratégico e, há três anos, a gente trouxe 300 famílias pra cá. Foi um trabalho de nove meses de trabalho psicológico, emocional, financeiro. Nossa sede continua em Franca, com o serviço integrado lá. Mas a gente tem um escritório de negócios onde está toda a parte estratégica. Foi para facilidade de mobilização. De receber e de ir. Porque são cinco horas de Franca a São Paulo. Então é muito difícil para os líderes virem e voltar, e aqui você atende cinco fornecedores no mesmo dia. 

OP – Existe algum intercâmbio quando uma nova unidade é aberta? 
Luiza - Tem um plano de carreira. Quando é aberta uma unidade, o gerente, o gestor, o vendedor especial vem de outra unidade. O resto é cotado na própria Cidade.

OP – A senhora tem perfil no Twitter e no Instagram. Quem faz as postagens?
Luiza - Nada vai ao ar sem antes passar por mim. Eu dou os temas e, muitas vezes, as pessoas redigem, mas tudo sou eu quem dou briefing e leio. Nada é feito sem mim. E você tem que aprender lidar (com redes sociais). Aprender a receber críticas. Se você não estiver lá, de todo jeito alguém vai te criticar por lá, não é? Hoje é um meio que você não tem jeito de falar: não quero estar nele. 

OP – A senhora é uma pessoa de religiosa, de fé. Como isso influencia nos negócios?
Luiza - O que nós somos é espiritualistas. A gente acredita numa força natural, espiritual e a empresa assume isso. Eu acho que isso, em um momento de estresse, acalma. 

OP – A senhora tem uma ligação com o Ceará. Seus filhos são netos de cearense. A sua filha, que é chef de cozinha, faz pratos da culinária cearense...
Luiza - O meu marido, que já faleceu infelizmente, ele era filho de cearense. E minha filha hoje é famosa na culinária, lançou o segundo livro e ganha prêmios. E ela resgata muito o que ela aprendeu com a avó que é cearense.

OP – Como é a sua relação com a CVM (Comissão de Valores Mobiliários)? Ela poda muito sua liberdade - de falar sobre a empresa por exemplo?
Luiza - Não, não é. A relação é de muito respeito e aprendizado. A gente já teve um sócio por sete anos, que era de um fundo Internacional. Ele tinha só 12% mas a gente tratava como se tivesse 50%. Então, é uma empresa que sempre aprendeu a dar satisfação. 

OP - A senhora espera faturamento de R$ 9 bilhões neste ano. Esse plano de expansão atrapalha os resultados?
Luiza - A gente comprou duas redes em dois anos, mas empresa já voltou ao normal. 

OP – A senhora continua com planos de expansão? Por meio de aquisições ou orgânico...
Luiza - Sim. Principalmente no Nordeste. Aquisições não. Mas de aberturas de lojas. Principalmente aí no Nordeste. A gente têm aberto muitas lojas e vamos continuar a aumentando aí.

OP – Quando conversamos, em agosto, no Rio de Janeiro na reunião do Integra Brasil com o BNDES (Banco Nacional do Desenvolvimento), a senhora disse que o Ceará estava cotado para receber um Centro de Distribuição. Esses planos estão mantidos?
Luiza - Lógico! A gente está fazendo um Centro de Distribuição na Bahia, depois vamos botar no Ceará. Eu já conversei com o Governo do Ceará, mas não oficialmente. Ainda vamos conversar. 

OP – A senhora tem quatro netos. A senhora pensa em colocá-los na empresa mais adiante?
Luiza – Eles ainda são muito pequenos. O mais velho tem sete anos. Nem os meus filhos foram criados para trabalhar na empresa, muito menos meus netos. Eles só foram criados para ser profissionais. Aqui ou fora daqui. Pode ser uma influência, mas também pode não ser. Minha filha, por exemplo, foi mexer com cozinha, então depende muito da vocação deles. 

OP – A senhora ficou viúva há quatro anos. Como foi essa fase?
Luiza - Na empresa, nada mudou porque meu marido nunca teve negócio aqui dentro. Particularmente, é uma dor muito grande. É uma perda muito séria. É a perda de um conselheiro. Mas ele não tinha nenhum vínculo com a empresa. Nós temos um acordo com os acionistas em que os agregados que entram da família não podem trabalhar na empresa. O meu marido tinha as coisas dele, particulares. 

OP – Como é a sua rotina hoje no trabalho?
Luiza - Na empresa, trabalho umas 10 horas (ao dia). Em casa, eu levo um iPad. Eu tenho uma linha direta com o cliente. Mas assim: eu tenho tempo para tudo. Assisto novela, leio jornal. Eu tenho amigos, uma vida é normal. 

OP – Com o Magazine Luiza tão presente no Brasil, a senhora conhece bem o País?
Luiza - Bem, não. Eu acho que conhecer bem o Brasil é difícil, mas eu sou bem apaixonada. A Magazine Luiza canta o Hino Nacional há 10 anos. Tive contato com as cidades onde abrimos unidades, fomos falar com os funcionários, com os governos. Na época, eu tive muito aí (no Ceará).

Perfil

Nascida em uma família de comerciantes, Luiza Helena Trajano Inácio Rodrigues começou a trabalhar aos 11 anos na loja fundada por seus tios, o casal Luiza Trajano e Pelegrino José Donato, em 1957 em Franca, no interior de São Paulo. No começo, Luiza aproveitava o período das férias para vender e ganhar comissões. As 18 anos entrou definitivamente na empresa, onde passou por todos os setores até tornar-se superintendente do Magazine Luiza, cargo que já havia sido ocupado por seu pai. Em 1998, o Magazine Luiza entrou, pela primeira vez, na lista das melhores empresas para se trabalhar no Brasil, em pesquisa do Instituto Great Place to Work. Em 2002, Luiza ganhou o prêmio Empreendedor do Ano, concedido pela empresa Ernst & Young. Em 2011, o Magazine Luiza abriu o capital na Bolsa de Valores e realiza sua 13ª aquisição de redes da sua história. Viúva desde 2009, do também empresário Erasmo Rodrigues, com quem foi casada por mais de 35 anos, Luiza tem quatro netos é mãe de três filhos: Frederico, que segue seus passos na empresa, Ana Luiza, chef de cozinha, e Luciana, publicitária. 

LUIZA TRAJANO NO CEARÁ
O Magazine Luiza tem 21 lojas no Ceará, sendo 11 em Fortaleza e as demais no Interior. Nos planos para o Estado, está um Centro de Distribuição. “Depois que a gente terminar o de Salvador, vamos abrir um aí”. A relação com o Estado também é afetiva. Viúva de Erasmo Fernandes Rodrigues, ela é nora de uma cearense. Por influência da avó, a filha da empresária, a chef Ana Luiza, cozinha pratos típicos do Ceará. E Luiza Trajano diz que adora, inclusive buchada.

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